quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

O início


A Vida inicia e cessa o seu rumo na mais rápida corrida que se conhece. O início, emoldurado de sorrisos triunfantes, após berros e apelos a que termine, que nos arregala os olhos e os faz fechar com a luminosidade de quem (não) vê. O início da ignorância e do afeto - o início da inocência. Aquele início em que (não) há solidão e em que as carícias, intermináveis, provocam uma calmia assustadora. O início de outro tipo de luz. O início de uma corrida que insistimos em não percorrer. 
Perante o primeiro obstáculo a reação primeira é (quase) colocar a mão esquerda na testa, cabisbaixo e com a lágrima a percorrer o corpo que não se conhece. Até que alguém, ao nosso lado, nos percorre as veias bombeadas pelo coração fervilhante de emoção. O alguém - que nunca se sabe quem é - que nos faz abrir os olhos perante a luz e, firmes, deitar-nos no lugar ainda vazio da cama ocupada. Aquele lugar que sempre receaste, agora, perante os teus olhos lacrimejantes, a chamar por ti. 
Deitas-te, em busca de uma utópica felicidade e num estímulo o teu corpo reage - o teu corpo, cansado da infinitude das tuas lágrimas, faz-te esboçar o último sorriso: aquele que dita a felicidade na corrida que irá começar. Se há início, é porque o fim ainda está longe de alcançar.

Fotografia por: Alejandro Kirchuk: Never let you go - World Press Photo (2012)

domingo, 6 de janeiro de 2013

Gritos mudos


Gritos sensacionais deitados pela pólvora seca da civilização. Gritos de abandono, gritos de solidão. Em linha reta, em busca do desconhecido, o povo grita sem suporte nem base, sem apoio nem seguro, sem família nem lar. Em busca do que não sabem o que é, o povo aplaude, gentilmente, quem reconstrói o paraíso. Sobre cinzas, os corpos avançam destinados a não viver. Não sabem porém que as imagens guardam o seu testemunho, em linhas retas que não terminam no seu coração. Os homens aplaudem, gritam e lutam na rouquidão que o mundo é. Outros, famintos de orgulho, abastecem-se de nutrientes que faltam: determinam a sua sobre-existência. Imagem estática da civilização, em tentativas frustradas e constantes de repressão.

Dawn of a revolution - Cairo, Egypt - World Press Photo (2012)

sábado, 5 de janeiro de 2013

(re)começo


Depois de uma longa viagem em busca do fim, recomeçamos soterrados em destroços de uma vila carbonizada. Os extremos do corpo gelam de medo e aflição confrontados com a pequenez que somos. Triangulações perfeitas, numa harmonia idealizada, não são nada mais que imaginação. E o sonho, que nos comanda, faz-nos lastimar por almas perdidas e desalojadas. Triângulos de medo e indecisão no rosto de quem nunca chorou. Sempre conectados com o mundo, longe de nós. Transformações catastróficas da paz. Imagens que valem tudo, menos os nossos corpos - esses nem a natureza consegue matar. Comandam-nos a vida em segundos, enquanto pressentimos que o comando está nas nossas mãos.

 TSUNAMI AFTERMATH; World Press Photos (2012)